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terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Descubra as belezas naturais que a Serra Capixaba esconde entre as montanhas


No Espírito Santo, à primeira vista, nada é o que parece ser. No mapa, o menor Estado do Sudeste pode dar a impressão de ser apenas um pit stop para turistas fluminenses que seguem, numa viagem de car­ro, para o litoral sul da Bahia. Ou um celebrado destino para os mineiros em busca de mar. Mas há o que fazer por lá que não seja pegar sol e comer a fa­mo­sa moqueca capixaba, que no Estado não le­va dendê. Feliz­mente, o visitante pode constatar que existem outros lugares onde o Espírito Santo vai além dessa primeira impres­são, como a Serra Capi­xaba, região colonizada por alemães e italianos.

A cerca de uma hora de carro da capital, Vitória, ou quatro horas de trem desde Viana, a Serra Capixaba é uma região de ar pu­ro, clima sossegado e friozinho à noite, que esconde um bocado de surpresas em pequenas e pacatas ci­dades, como Domingos Martins, Ven­da Nova do Imigrante, Santa Teresa, Santa Leo­poldina e Vargem Alta.

Nelas, é possível admirar paisa­gens com cachoeiras e pedras que mudam de cor, provar comida italia­na prepa­rada com muita sofisticação em restau­rantes camuflados de simplicidade, visitar fazendas, jogar golfe e relaxar em meio à natureza.

Na volta para a cidade de ori­gem, o visitante vai sentir que valeu a pena apostar nesta viagem, que certa­mente mostrará como um Es­tado discreto e “es­premido” entre ou­tros tão bada­lados (Rio de Janeiro, Minas e Bahia) tam­bém tem atrações para lá de cativantes.

Trem das Montanhas
Para conhecer a beleza, a tran­quilidade e os prazeres das cidades serranas do Espírito Santo é possível fazer o caminho por uma via ferroviária, reativada em 2010 pe­la empresa Serra Verde Express. A mesma empresa que realiza tours de trem na Serra do Mar, no Paraná. Em trilhos capixabas, o grupo opera o Trem das Montanhas, pas­seio com duração de quatro horas feito a bordo de uma li­torina, composição de um vagão com capa­cidade para 56 pessoas.

Nos fins de semana, a litorina ser­penteia por entre pontes, viadutos e túneis, em um trajeto que parte da Estação Ferroviária de Viana e exibe montanhas verdejantes onde, vez por outra, surge uma cachoeira. Com pare­des amarelas e adornos na fachada, a Estação de Viana, construí­da em 1895, mantém o jeitinho de antigamente: ali até pode ser vista uma sala com equipa­mentos que já foram usados no tempo em que funcionava a ferrovia que li­gava o Estado ao Rio de Janeiro.

A primeira parada do trem é em Domingos Martins, principal cidade da região serrana. Em frente à pequena e bem cuidada praça central, há uma igreja luterana cuja torre é um marco da generosidade do imperador D. Pedro II para com os imigrantes: foi a pri­meira construída em um templo protestante no Brasil, graças a uma autorização especial do monarca. Torres, no século 19, eram exclusividade das igrejas católicas.

Ao lado da cidade, numa área cha­mada Campinho, 300 mil m2 de mata atlântica são protegidos na Reserva Kautsky, pertencente ao instituto fun­dado pelo já falecido empresário e co­lecionador de orquídeas Roberto Kau­tsky. Dificil­mente, alguém pesqui­sou e coletou tantas orquídeas quanto Kau­tsky, que foi ajudado pelo clima da re­gião serrana: a variação entre o nível do mar e a serra contri­buiu para que a flor se tornasse comum por ali e se desen­volvesse em diversos tipos.

A reserva apresenta orquídeas, bromélias e um caminho de terra para admirá-las, bem como vistas da serra e do litoral que ficou para trás. Com sorte e atenção, além dos pás­saros, o visitante avista algum macaqui­nho. E, com o ar puro e o verde ao re­dor, sai revigorado pa­ra continuar o tour.

Primeiros alemães
A segunda parada do Trem das Montanhas é em Marechal Floriano,  também intimamente ligada à imi­gração alemã e ao “culto” às or­quí­deas. A cidade foi o primeiro nú­cleo de colo­nização germânica no interior do Es­pírito Santo, como mostram as fachadas de algumas casas e o restau­rante Grossmu­tter, com especialida­des da gastro­nomia ale­mã e recei­tas suíças e húngaras.

Pratos com carne de carneiro, cos­teletas de porco, salsichas, chu­crute e galinha ao molho pardo são algumas das delícias da casa, que podem ser acom­panhadas pela tradicional cer­veja alemã Weltenburger Kloster. Tudo levado à mesa por garçonetes ves­tidas em trajes típicos. É comida para aqueles que não estão preo­cupados com a dieta, e sim em saírem satis­feitos e alimentados com “sustança”.

Guarde a delicadeza para visitar os orquidários de Marechal Floriano: o Florabela e o Nego Plantas. Neste úl­timo, o dono, que, apesar do ape­lido que deu nome ao estabeleci­mento, também é descendente de alemães e se chama Vital Schunk, montou um museuzinho informal nos fundos do orquidário. Nele, expõe fotos, má­qui­nas de costura e outros objetos dos pri­meiros alemães que chegaram à cidade.


O passeio termina em outra estação de paredes amarelo-ocre: a situada em Araguaia, distrito de Marechal Floria­no. A vilazinha com cerca de 700 ha­bitantes era o ponto final da viagem dos imigrantes ita­lianos que também povoaram a Serra Capixaba, os quais entravam no Esta­do a partir do Rio Benevente, na cida­de litorânea de An­chieta (onde morreu o padre jesuíta que foi um dos fundadores de São Pau­lo). O visitante descobre como eles viviam, se adaptaram à região e se vestiam na Casa Rosa, construção do século 19 que mantém estrutura, mobília e vesti­mentas do tempo em que foi erguida.

Roteiro de carro
O Trem das Montanhas é um jei­to de explorar a serra de uma vez só. Mas que tal alongar a estada co­nhe­cendo outras cidades e sentindo o frio­zinho agradável que faz pratica­mente o ano todo? Esse é um roteiro perfeito para ser feito de car­ro, graças à pouca dis­tância entre as ci­dades e à rede de es­tradas federais e estaduais que as liga.

Saindo de Vitória pela BR-262, alcança-se Campinho em menos de uma hora e, logo depois, Marechal Floriano. Em seguida, há uma deci­são a tomar: virar à direita, na ES-376, em direção a Alfredo Cha­ves, ou seguir para Venda Nova do Imi­grante, última cidade cortada pela rodovia antes de se chegar a Minas.

Na primeira opção, o caminho também leva a Matilde, um vilarejo minúsculo com outra bonita estação de trem que remonta ao tempo em que esse meio de transporte ligava o sul do Espírito Santo ao Rio. O trajeto  per­mite contemplar a Ca­choeira do En­genheiro Reeve, dona de uma queda- d’água de 63 metros, a maior do Es­tado. O lugar é procu­rado, ainda, pelos prati­cantes de voo livre e para­pente, por causa de uma rampa a 465 metros de altura, localizada no distrito de Cachoeira Alta.

Pedra Azul e outras cores
Seguindo em frente pela BR-262,  novamente vale a tese apre­sentada no começo desta reporta­gem: no Es­pírito Santo, nada é exata­mente o que parece. É o caso de uma pedra enorme, na qual parece subir um la­garto gigante, que fica na chegada a Venda Nova do Imigrante.

Eis a Pedra Azul, cuja superfície é recoberta por liquens, que lhe garantem a tonalidade que deu origem ao seu no­me. A ação dos tais liquens, com a incidên­cia de raios solares, ainda faz a enorme rocha mudar de cor. Ou seja, a pedra não é só azul. E o la­gar­to tam­bém é um “monumento” à parte, e tem o nome de Pedra do Lagarto, é cla­ro.

A Pedra Azul está ligada à imagem turística de Venda Nova – apesar de ficar no território de Domingos Mar­tins, a formação domina sobre­tudo a paisagem da primeira cidade. À sua volta, existe um parque que preserva a mata atlântica, aberto para passeios que levam até a pedra. A área também guarda mansões e fazendas cujo con­forto surpreende quem liga vida rural a rusticidade.

As propriedades rurais podem ser visitadas no circuito de agroturismo da cidade. É chegar, pedir para entrar e muitas vezes sair desses lugares com produtos comprados dos mora­dores, como geleias, doces e o ex­cên­tri­co vi­nho de jabuticaba, um subs­tituto do vinho de uva que os imi­gran­tes ita­lianos improvisaram ao che­gar ao Espí­rito Santo. Tome como se fosse um licor, sem exagero, caso con­trário, a dor de cabeça no dia seguinte será ines­quecível.

Café do cocô do jacu
O café orgânico e artesanal feito pe­las famílias da cidade, como a Car­nielli, também tem um sabor especial e marcante. Mas nada pode ser mais diferente – e caro – do que o pacote de café vendido a “mó­dicos” R$ 400, o quilo, no Posto dos Moran­gos, uma delicatessen na altura do quilômetro 93 da BR-262. Do outro lado da ro­dovia, na Fazenda Camocim, dá para comprar o produto por um preço um pouco mais baixo, mas não muito.

O que há de tão precioso nesse café, cuja produção é quase toda exportada para Japão e Estados Unidos, é que, bem, seus grãos foram retirados do cocô expelido por um pássaro. E como é que o quilo desse inusitado produto vale tanto quanto uma garrafa de vinho de primeira linha? Vamos ao processo...

O Jacu Bird Coffee, nome da marca desse café, é feito com grãos da varie­dade arábica, que foram de­glu­tidos e depois eliminados, por meio do mé­todo mais tradicional possível, pelo jacu, um pássaro de pe­nas negras e papo vermelho, do ta­manho de uma galinha.

Na Fazenda Camocim, essa técnica, ao contrário do que se poderia supor, enriquece o café. Os grãos que, per­doem o trocadilho, saem da última sílaba do nome do pássaro são postos para secar e depois moídos, resultando num pó que origina uma bebida forte, doce e encorpada, cujo quilo vale de R$ 380 a R$ 450, segundo Henrique Sloper, proprietário da fazenda. “O Jacu Bird Coffee é uma expressão dos grãos em seu pon­to ideal de maturação. Quem bebe, sente um sabor doce e suave, com baixa acidez, e aromas de choco­late e nozes”, descreve Sloper.

Especialistas em café vão associar o método brasileiro a um da Indonésia, onde se faz o Kopi Luwak, este sim, o mais caro café do mundo, cujos grãos são extraídos das fezes do luwak, um marsupial do país. E foi justamente numa ida à Indonésia que Henrique Sloper pro­vou o Kopi Lu­wak e teve a ideia de nacionalizar a técnica, origi­nando o produto capixaba.

Bons hotéis e restaurantes
O Jacu Bird Coffee também é ven­­dido no Rabo do Lagarto, um hotel-butique no entorno do Parque da Pedra Azul, ainda em Domingos Martins. Com um bistrô, edredons de pena de ganso, 14 das suas 18 suítes equi­padas com lareira (há outra no salão do res­taurante) e uma des­lum­brante vista da Pedra Azul aces­sível de todas as acomo­dações, o Rabo do Lagarto é um bom ponto também para obser­va­dores de pás­saros, os quais podem contem­plar gaviões, tucanos, caná­rios e tiês.

Ainda nas imediações da Pedra A­zul, na estrada em direção à cidade de Vargem Alta, há uma área para a prá­tica de outra atividade que, aos pou­cos, ganha adeptos no Brasil: um cam­po de golfe, construído no Hotel Fazen­da Monte Verde, outro bom lugar para passar a noite. São apenas nove buracos, mas, por conta de obs­táculos como la­guinhos, montes de areia e arbus­tos, completar o circuito fica mais difícil do que parece à pri­meira vista.

Como a história da imigração eu­ro­peia e a agricultura familiar são as prin­­cipais marcas das montanhas capixa­bas, tais traços seguem pre­sentes tam­bém à mesa de alguns res­tau­rantes da re­gião. O Valsugana e o Espaço Vel­lozia, praticamente vi­zinhos e próxi­mos da Pedra Azul, aproveitam produ­tos comprados dos fazendeiros das redon­dezas para ofe­recer dois cardá­pios bem diferentes.

No Vellozia, as receitas de ins­pira­ção francesa levam, por exemplo, le­gumes e frango caipira, misturados a iguarias modernas, como no caso da codorna desossada que, combi­nada com cereais, trufas e mandio­quinha. No Valsugana, a especialidade são os pratos do norte da Itália. Nos dois, há um estoque sor­tido de vinhos impor­tados para acom­panhar as refeições.

A cozinha francesa também dá o tom na Brasserie Apogeu e no res­tau­rante Metropolitain. Ambos ficam junto à Chez Domaine, pousada criada pela francesa Isabelle Cicatelli e seu ma­rido, Joaquim Silva, com o obje­ti­vo de aproveitar ao máximo a natu­reza e a agricultura familiar da região. “A ideia de Isabelle foi reunir em um só lugar a produção de ali­mentos orgâ­nicos e biodinâmicos certificados, da semente ao prato, e com uma varieda­de que pudesse atender aos hóspedes e aos visi­tantes”, explica Silva.

Outro bom restaurante está nas terras de uma das famílias de imi­grantes mais antigas de Venda Nova – a qual, por conta das mu­danças que seu so­brenome sofreu nas mãos de dife­rentes tabeliães, que iam regis­trando os filhos nascidos no Brasil, é hoje di­vi­dida entre Lo­rençon, Loren­zon, Lourenção e Lorenzoni. O res­taurante acabou fi­cando com o nome de Don Loren­zoni e é um pe­queno e acolhe­dor estabe­lecimento montado em um an­tigo paiol de fazenda, decorado com ob­jetos que lembram a história da família.

A cozinha é chefiada por Fer­nando Lorenzoni, que, depois de pas­sar por restaurantes da Europa e dos Estados Uni­­dos, voltou ao Brasil para abrir a ca­sa, dando aos pratos típicos dos imi­gran­tes, como o socol e a po­len­ta, uma “roupagem” gastro­nô­mica moderna.

Encontrar lugares ro­dea­do pela paz da mata atlântica, pela rotina tranquila dos sítios, por forma­ções rochosas monumentais e até por um valioso café “extraído” das fezes de um pássaro, é confirmar, de uma vez por todas, que o Espírito Santo vai muito além da primeira impres­são, que, no turismo, passa pelo tripé sol, praia e moqueca. E esta viagem pela Serra Capixaba, feita de carro ou a bordo do Trem das Mon­tanhas, pode ser o primeiro saboroso aperi­tivo, no sentido literal, das belezas que o Estado esconde.

Fonte: Viaje

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