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segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Caminho para nova política no Egito enfrenta obstáculos econômicos

Depois de um ano de tumultos intermináveis e de um governo militar, o Egito enfrenta uma aguda crise financeira que pode vir a atrapalhar a sua transição política e representar um desafio para os islâmicos que estão se estabelecendo no poder.

Com dívidas se amontoando, um crescimento econômico insignificante e a diminuição de suas reservas estrangeiras, os governantes militares e o Parlamento, que agora é liderado pelos islâmicos, devem enfrentar algumas escolhas difíceis, a começar pela desvalorização quase inevitável da moeda do Egito, que pode fazer com que os preços dos alimentos e de outros bens comuns aumentem de maneira absurda.

O governo também poderá em breve ser forçado a reformular o vasto sistema de subsídios de energia, que hoje responde por um quinto dos seus gastos. O aumento nos preços dos alimentos e as reduções de subsídios já provocaram motins no país no passado.

"A situação é terrível", disse Magda Kandil, diretora executiva do Centro Egípcio de Estudos Econômicos, que chamou alguns dos indicadores recentes de "alarmantes".

Como um sinal da gravidade da situação, na semana passada o conselho militar mudou sua postura e reabriu as negociações com o Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre as condições de um empréstimo de US $ 3,2 bilhões. Os generais rejeitaram o mesmo acordo previamente considerando o mesmo uma afronta à soberania nacional, mas hoje as autoridades do governo militar dizem que talvez precisem pedir um empréstimo ainda maior.

Além disso, a Irmandade Muçulmana, o grupo islâmico que hoje controla a metade das cadeiras do novo Parlamento, também indicou sua abertura para a ajuda financeira em sua reunião com os representantes do FMI - uma inversão de postura ainda mais impressionante, oito décadas depois de terem renunciado ao colonialismo ocidental e à dependência árabe.

Os líderes da Irmandade reconhecem que a maneira com a qual irão administrar o Egito durante a crise será um teste de sua capacidade de governar. Ativistas concentrados em forçar os governantes militares do Egito a abandonar o poder, no entanto, dizem que o mal-estar econômico se tornou um grande obstáculo para sua causa, uma vez que tantos egípcios passaram a almejar um retorno à estabilidade.

Outros observam com consternação que as frustrações básicas que ajudaram a alimentar os protestos que derrubaram o presidente Hosni Mubarak um ano atrás, se tornaram mais aguçadas desde então, especialmente para as legiões de joves desempregados ou subempregados.

A crise econômica é mais evidente no negócio de casamentos egípcios, que é um rito de passagem muito caro no país e marca a transição para a vida adulta - e gera uma receita quase do mesmo valor que a do orçamento de ajuda anual dos Estados Unidos para o Egito.

Em um bairro do Cairo atingido pela crise, planejadores de casamentos dizem que os casais tiveram que desistir de eventos que normalmente custavam cerca de US$ 300 dólares antes da revolução, pois hoje podem pagar apenas US$ 100. Joalherias dizem que o valor médio que os noivos gastam em presentes tradicionais feitos de ouro para suas noivas caiu acentuadamente e DJs afirmam que agora fazem apenas dois ou três casamentos por mês, quando antes da revolução faziam uma média de dez.

"Ninguém quer se casar depois da revolução", disse Amr el-Khodary, 37 anos, que foi forçado a fechar sua loja de aluguel de carros para casamentos.

Ibrahim Mohamed, um motorista de táxi de 26 anos de idade, com um diploma universitário, é um exemplo da situação. A queda acentuada nas tarifas, segundo ele, fez com que deixasse de economizar os cerca de US$ 7 mil que precisava para comprar um apartamento, móveis, fazer uma pequena cerimônia de casamento e comprar a joia que precisa oferecer para sua noiva para que possam se casar. "Se não tivesse sido pela revolução, eu teria conseguido me casar."

As razões para a sua situação foram se acumulando durante todo o ano: o corte no investimento estrangeiro, o declínio de 30% nas visitas turísticas e a estagnação do crescimento econômico. A taxa de desemprego oficial é de 12%, mas entre os jovens a taxa real de desemprego é de pelo menos o dobro.

Os governantes militares também governaram em um período de muita turbulência financeira. A inflação subiu em dois dígitos e a taxa de câmbio da moeda, a libra egípcia, está sob forte pressão. As reservas cambiais caíram, com o governo gastando cerca de US$ 2 bilhões por mês em uma batalha falida que tenta sustentar a moeda. A reservas em moeda estrangeira caíram para cerca de US$ 10 bilhões de cerca de US$ 36 bilhões de antes da revolta.

Economistas dizem que os governantes militares podem ter contribuído com a piora da situação quando não quiseram aceitar o empréstimo do FMI, em junho do ano passado, e que o empréstimo poderia ter fornecido a ajuda necessária para fortalecer a moeda do país e criar um selo de aprovação financeiro que poderia ter ajudado a tranquilizar os investidores e os doadores estrangeiros.

Em vez disso, o Conselho Militar tentou sustentar os déficits crescentes do governo por meio de empréstimos feitos internamente, enquanto as empresas lutam para obter os empréstimos que precisam para expandir e revitalizar a economia.

Agora o governo militar também parece ter esgotado as suas fontes domésticas. Na segunda-feira, o governo conseguiu vender aos bancos egípcios apenas cerca de um terço de uma planejada oferta de títulos avaliados em US$ 580 milhões, mesmo com rendimentos que chegaram a atingir um novo pico de quase 16% - após ter feito uma estimativa de uma inflação de cerca de 10% a 12%, algo que gerou o equivalente a uma taxa de juros de 4% a 6%.

"Fazer empréstimos contínuos do mercado interno é literalmente uma política falida", disse Ragui Assaad, um economista egípcio da Universidade de Minnesota, que agora está no Cairo.

Mesmo com novas fontes de moeda estrangeira do FMI, segundo ele, o Egito em breve será forçado a aceitar uma nova redução na taxa de câmbio - gradualmente, se o governo tiver sorte. "Claro que vai doer", disse Assaad. "Mas não haverá nenhuma outra opção a não ser a de desvalorizar a moeda.”

O medo de uma inflação crescente já está fazendo parte do cotidiano de muitos. "Ninguém coloca seu dinheiro no banco, porque todos têm medo que ele não vai valer nada depois”, disse o mecânico Shaaban Hamdy, 40 anos. "Por que eu iria colocar o meu dinheiro em um banco? Eu não sei o que está para acontecer."

Mas uma outra solução que muitos economistas parecem favorecer – modificar as políticas que tem feito com que Egito gaste mais de US$ 15 bilhões por ano em subsídios de energia - hoje parece politicamente impossível. Trata-se de um sistema regressivo que beneficia a maioria daqueles que dirigem veículos utilitários esportivos e vivem em casas com ar-condicionado e outros países com sistemas similares bem sucedidos os têm substituído com subsídios mais direcionados para aqueles que precisam.


Mas a maioria dos egípcios valoriza o subsídio como um direito de nascença e poucos acreditam que o governo de transição tem a credibilidade ou a legitimidade para fazer uma grande mudança. "Alguém tem que ser capaz de convencer as pessoas de que elas serão compensadas de alguma maneira”, disse Assaad.

Ainda assim, muitos economistas afirmam que o Egito pode navegar em torno do potencial colapso. Eles observam que o governo militar recentemente anunciou planos para cortar quase US$ 4 bilhões do déficit, diminuindo-o para US$ 30 bilhões, ou mais de 10% do PIB. Entre outras coisas, o governo começou a cortar os subsídios de energia para a indústria pesada, talvez como preparação para as mudanças que o FMI pode vir a exigir.

Além disso, Ahmed Galal, diretor do Fórum de Pesquisa Econômica, com sede no Cairo, disse que os economistas estavam cada vez mais otimistas sobre as políticas da Irmandade Muçulmana. O grupo deixou claro que apoia o livre mercado e já começou a discutir a urgência da reforma nos subsídios. Seus legisladores começaram a elaborar propostas para resolver o problema quando eram membros da minoria da oposição sob o governo de Mubarak.

"Esses caras querem se dar bem", disse Galal sobre os parlamentares da Irmandade. "Eles estão realmente oferecendo propostas que são bastante moderadas, muito cívicas, bastante abrangentes, e eles estão se baseando em países como a Turquia, ao invés do Irã ou do Afeganistão."

Fonte: Último Segundo

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